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Novo pacote poderá significar mais tributação

Objetivo é elevar a competitividade da indústria de transformação.

Segundo reportagem do Valor de 12 de julho de 2011, o governo prepara um pacote para estimular a indústria em função das dificuldades que o setor tem enfrentado com o câmbio valorizado. Um dos pontos centrais do pacote seria a desoneração da folha de salários. Ela afetaria todos os setores da economia e teria como meta zerar a contribuição patronal sobre a folha de salários em quatro anos.

Para compensar a Previdência pela perda de receita, são apontadas três possibilidades: a) reviver a CPMF; b) elevar a contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) das empresas; e c) "recalibrar a alíquota da Cofins sobre o faturamento das empresas."

O objetivo da troca de tributos é elevar a competitividade da indústria de transformação, que, de fato, tem apresentado muitas dificuldades com a valorização cambial. Contudo, é importante que a troca tributária não tenha o efeito colateral de reduzir a taxa de poupança. Sabe-se que dos 18% do Produto Interno Bruto (PIB) anualmente poupados, 15% referem-se à poupança das empresas. Se houver troca da contribuição contra elevação da CSLL, haverá impactos negativos sobre a taxa de poupança, o que contribuirá para pressionar as taxas de juros ainda mais.

Assim, se fosse necessário escolher, uma avaliação preliminar das três alternativas levaria à opção pela desoneração da folha tendo como contrapartida a recriação da malfadada CPMF. Evidentemente, se o objetivo for aliviar a carga de todo o setor produtivo, a receita da CPMF não seria capaz de tapar o buraco gerado. Para se ter ideia, somente a desoneração da folha de salários da indústria de transformação corresponde, aproximadamente, a 1,5% do PIB, ou seja, à receita de uma CPMF com alíquota cheia, isto é, de 0,38%. Ao desonerar a folha de toda a economia, a perda de receitas não seria compensada somente pela CPMF.

Medida abriria um precedente para o governo aproveitar para "apagar outros incêndios"
Para que a medida fosse eficaz e pudesse compensar a indústria de transformação pelas dificuldades com o câmbio, a desoneração teria que ser somente para esse setor. Essa proposta, contudo, por restringir o benefício à indústria de transformação, corre o risco de fazer outros setores ingressarem com ações na Justiça para ter o mesmo tratamento.

Assim, para que os riscos fossem minimizados, o incentivo à indústria de transformação deveria ser transitório e a lei que cria o imposto que compensaria a Previdência pela queda de receita, em função da desoneração da indústria, teria que prever data e regra de transição de retorno ao financiamento normal por meio de contribuição sobre a folha de salários. Isto é, tratar-se-ia de medida transitória. Difícil acreditar que nasceria uma boa política quando analisamos todos esses condicionantes.

Mais do que isso, a possibilidade de utilizar mecanismos tributários para compensar o setor industrial abriria precedente para o governo aproveitar a oportunidade para "apagar outros incêndios". Nas adequações a serem feitas para compensar as perdas com as desonerações, a conta das despesas que sofrerão aumentos a partir de 2012 poderia facilmente ser incorporada e, com isso, o resultado apontaria em direção a aumento da carga tributária. Isto é, o imposto a ser criado para compensar a perda de receita com a desoneração da folha poderia incorporar a necessidade de elevação de impostos por conta de aumentos de gastos já contratados por outros motivos.

A conta estimada é de R$ 51,1 bilhões, que inclui: R$ 7,5 bilhões para pagamentos de precatórios, R$ 20,6 bilhões para aumento dos gastos com pessoal e R$ 23 bilhões para a Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), a Previdência (INSS) e o Seguro-Desemprego (que terá aumento elevado no ano que vem por conta da indexação ao salário mínimo). Isto é, o gasto representaria cerca de 1,5% (equivalente à receita de uma nova CPMF).

Importante lembrar que as receitas fiscais continuariam em trajetória de alta. Considerando que as receitas do governo central (líquidas de transferências a Estados e a municípios) devem se manter em torno de 20% do PIB, entre 2011 e 2012, isso significaria um espaço nominal de R$ 66 bilhões para expansão de gastos (sem afetar o primário). Ou seja, 77,4% disso (ou R$ 51,1 bilhões) já estariam comprometidos apenas com as três despesas acima explicitadas. Restariam para a elevação dos demais gastos, R$ 14,9 bilhões (R$ 66 bilhões menos R$ 51,1 bilhões).

Fizemos uma estimativa da elevação adicional dessas despesas mencionadas. Mantendo esses gastos no mesmo percentual do PIB que projetamos para 2011, teríamos um avanço nominal de cerca de R$ 26 bilhões nesse grupo de despesas, exceto Previdência. Somando-se a isso o efeito do reajuste das demais categorias de beneficiários da previdência, que pela LDO devem receber um reajuste de 80% do PIB de 2010 mais o INPC, isto é, algo como 12% em termos nominais, teríamos mais R$ 4 bilhões. Dessa forma, a previsão de elevação dos gastos é de R$ 30 bilhões além dos R$ 51,1 bilhões.

É assim que o espaço dos aumentos "naturais" da receita do governo será insuficiente para comportar o gasto adicional (R$ 14,9 bilhões em excesso de receita, ante o aumento de R$ 30 bilhões nas demais despesas, totalizando uma "necessidade não coberta" de financiamento da ordem de R$ 15,1 bilhões ou 0,3% do PIB). Esse é o cenário que baliza nossa estimativa de um primário de 2,6% do PIB para 2012.

Como, então, financiar a iniciativa do governo em promover desonerações? A alternativa seria um ajuste pelo aumento da tributação, que poderia dar conta destes "buracos".

O fato é que vemos uma questão fiscal em aberto quando considerada a intenção do governo em somar à já pressionada conta de despesas adicionais contratadas para os próximos anos, a ideia de promover mais medidas expansionistas e incompatíveis com o padrão atual de tributação. Nesse sentido, ou o ajuste se daria em menos esforço primário ou em mais e mais aumentos na carga tributária para sustentar a nova empreitada governista.

Samuel Pessoa é doutor em economia pela USP e sócio da Tendências Consultoria.

Felipe Salto, economista, é mestrando em Administração Pública e Governo pela FGV-SP e analista da Tendências Consultoria.

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